Nesta segunda-feira (25), mais de 100 pessoas coroaram o último evento da I Semana da Consciência Negra promovida pela Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) em todos os 144 municípios paraenses desde o dia 18 de novembro: o I Seminário da Consciência Negra reuniu movimentos sociais e agentes públicos no auditório Alberto Bentes Guerreiro, no escritório central do órgão, em Marituba, na Região Metropolitana de Belém (RMB).
Participaram a Secretaria de Assistência Social e Cidadania (Semasc) da Prefeitura de Marituba, a Secretaria de Estado de Igualdade Racial e Direitos Humanos (SEIRDH) e a organização não-governamental (ong) Negro Zum.
O destaque da programação foi a Palestra Magna de Letramento Racial e Racismo Institucional, ministrada pelo gerente estadual de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Seidrh, Denilson Silva, de 36 anos, o Pai Denilson, líder do terreiro de tambor de mina Terreiro de Mina Nagô Caboclo Flecheiro, no bairro da Terra Firme, na capital Belém.
“O ‘racismo institucional’ consiste em práticas travestidas de burocracia exagerada no tratamento, imersão e interatividade das pessoas pretas, quando no contexto de acesso a serviços públicos. O maior desafio para a nossa população é ser enxergada pelas gestões oficiais como ‘grupo tradicional’, porque somos uma vivência sem diretriz escrita, baseada na ancestralidade”, explica.
O dirigente menciona escalas como violência obstétrica e violência policial: “Somos as principais vítimas dessas dinâmicas de agressão e letalidade. As mulheres, a juventude. Precisamos de ações afirmativas e mobilização para debater a transversalidade das políticas públicas, mitigar os efeitos da história de discriminação e opressão e tirar da invisibilidade os pretos da Amazônia, porque a Amazônia é preta”, diz, com foco na estatística de o Pará constar atualmente como segundo estado com maior proporção de pessoas negras, por autodeclaração, no Brasil, de acordo com dados do Censo de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – 79,6 % da população, atrás apenas da Bahia, com 79,7 %.
A secretária de assistência social e cidadania de Marituba, Joelma Reis, sinaliza a capacitação de servidores e a integração entre entidades públicas e da sociedade civil como caminhos para a igualdade étnica e racial: “Hoje trabalhamos com reconhecimento e autonomia, para garantir plenitude de direitos, valorização dos territórios e respeito aos costumes. Podemos colocar como demandas vagas em cursinhos populares e descentralização de oferta de exames médicos”, resume.
Para o diretor administrativo da Emater, Robson Silva, que compôs a mesa de abertura do Seminário, a oportunidade reforça o compromisso da Emater com os povos tradicionais, a partir da Política de Interesses Difusos e Coletivos (PIDC), lançada pela Instituição em 2023: “São ferramentas, dinâmicas e metodologias de atendimento, acolhimento e parceria de ater [assistência técnica e extensão rural] pública quilombola e com os Potma [Povos Tradicionais de Matrizes Africanas e Terreiros]. A inclusão é para todas as classes, todas as cores e todas as culturas”, apontou, em discurso na cerimônia.
Na ocasião, ainda, os movimentos sociais entregaram moções à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), à Prefeitura de Marituba e à Câmara de Vereadores do município, com requerimentos sobre projetos de lei, criação de um Fundo Municipal de Combate e Erradicação da Pobreza (Funmari) e a permanência de uma comissão municipal de igualdade racial e combate à intolerância religiosa.
Segundo o fundador da ong Nego Zum, Marcelo Ferreira, de 37 anos, responsável pelo recolhimento de assinaturas dos documentos coletivos, Marituba é uma “cidade preta”: “Se a maioria dos habitantes é preta, é parda, não se tem como ignorar a necessidade de direcionamento de discussões e especificações no âmbito público”, declara.
Seminário
O Seminário também sediou uma feira de produtos da tradição afro, como roupas estilizadas, bonecas de pano, biojóias e preparados de ervas.
Yaô Makini, de 43 anos, representante do grupo Arte de Kiloa, da Comunidade do Abacatal, em Ananindeua, na Grande Belém, expôs e comercializou misturas para defumação e fluidos para banhos de harmonização e limpeza. Os princípios ativos percorriam de patchuli a pitanga – tudo plantado, colhido e processado no próprio Abacatal, onde se pratica umbanda da vertente “afrobudígena”, de influência africana, budista e indígena.
A marca Arte de Kiloa é acompanhada pelo slogan “Arteiras que Tecem o Amanhã” e pelo lema “A Consciência é o Pilar dos Tempos”.
“Somos a resistência da resistência. Uma comunidade liderada por mulheres, atuantes sob afrorreligiosidade. Estes banhos e estas defumações podem ser feitos por qualquer pessoa de qualquer religião, dentro de casa mesmo, desde que não se molhe a cabeça. A ideia é limpeza espiritual e energética e harmonização da ‘centelha crística’, centro da Divina Presença, sobre o Deus ou deuses em que cada um acredita”, ensina.
Semana da Consciência Negra
De 18 a 25 de novembro, a Emater coordenou, em todo o Pará, ações de mutirão e festejo às populações negras, sobretudo quilombolas. Houve entrega de cadastros nacionais da agricultura familiar (cafs), prospecção de demandas para crédito rural e reuniões para inserção nas políticas públicas do segmento, entre outras atividades.
O presidente da Emater, Joniel Abreu, afirma que a Emater já desenvolvia atividades em territórios quilombolas, porém que somente a partir de 2024 iniciou de maneira afetiva atendimento inerente aos Potmas.
“A I Semana da Consciência Negra consagrou, assim, a visibilidade e o evidenciamento de atribuições e metas que passaram a fazer parte do dia a dia extensionista, em uma perspectiva antirracista e de postura de combate ao racismo estrutural, com o objetivo de agregar desenvolvimento social e econômico”, conclama.
Por: Ascom